quarta-feira, 26 de maio de 2010

Eleições e liberdade

André Hees

A Associação Nacional de Jornais (ANJ) promoveu no início do mês, em Brasília, um encontro entre juristas e jornalistas para debater as novas regras eleitorais e os limites para a cobertura da imprensa. Participaram da mesa advogados, ministros do TSE, colunistas e dirigentes dos principais veículos de comunicação do país. E a avaliação predominante é a de que o Brasil ainda enfrenta dificuldades para assimilar plenamente o conceito de liberdade de expressão.

A nova lei eleitoral, especialmente quando tenta regular o fluxo de informações na internet, é praticamente impossível de ser aplicada, além de revelar o desconhecimento do legislador sobre o tema.

A chamada minirreforma eleitoral, a Lei 12.034/2009, estabelece, por exemplo, no Artigo 57, que é livre a manifestação do pensamento, e "vedado o anonimato durante a campanha eleitoral, por meio da rede mundial de computadores - internet". A lei prevê ainda que um provedor de conteúdo poderá ser responsabilizado pela divulgação de um comentário de internauta que venha a ser considerado ofensivo, durante a campanha. No limite máximo da punição, o provedor estará sujeito até a suspensão do acesso, por 24 horas, a todo o seu conteúdo informativo.

O Artigo 57 está fundamentado no Artigo 5º da Constituição, que também veda o anonimato. Só que a norma, principalmente se aplicada à internet, chega a ser risível: o anonimato faz parte da paisagem da rede, gostemos ou não. A tentativa de controlar o debate parece ter raízes num autoritarismo atávico, como se a liberdade fosse uma outorga do Estado, que precisaria estabelecer as raias para o seu exercício.

O jornalista Fernando Rodrigues, colunista da "Folha de S. Paulo", lembrou que, nos Estados Unidos, há milhões de sites contra Barack Obama e contra John McCain. Na campanha eleitoral, Obama - que se revelou mais competente nesse terreno, em especial - utilizava os seus sites para rebater os ataques dos adversários, e sua equipe tinha estratégias para fazer as suas respostas ganharem visibilidade nos sites de busca, quando determinado assunto fosse pesquisado. Mas ninguém cogitava tirar sites do ar. Prevalece lá o espírito da Primeira Emenda: "O Congresso não legislará sobre liberdade de imprensa" - o que não significa que os veículos não tenham responsabilidade civil e criminal pelo que publicam.

"A tradição aqui é tentar censurar. O Brasil não tem uma cultura de liberdade de expressão. É melhor reconhecer o problema do que fazer de conta que ele não existe. Há muita incompreensão sobre o trabalho da mídia. No caso da internet, o Brasil tem 65 milhões de internautas. É possível abrir um site no Paraguai ou na Tailândia e acessá-lo daqui. É constrangedor, mas o legislador não sabe bem como funciona: você pode acessar um site e postar um comentário com um nome falso ou pode querer permanecer anônimo. É um direito do internauta, e é da natureza da internet. A lei não está de acordo com a realidade e nos coloca diante de um enorme ponto de interrogação", disse o jornalista, em debate realizado no dia 7 passado, no auditório do "Correio Braziliense."

Paulo Rossi, editor do On Line do "Correio", destacou as dezenas de comentários que são postados diariamente no site, com mensagens do tipo: "Não vote em Dilma porque ela é subversiva" ou "Não vote em Serra porque ele participou das privatizações e aquilo foi um roubo". Tentar controlar a rede pode provocar uma chuva de reclamações judiciais, de difícil identificação de fontes e provas.

O ministro Henrique Neves, do TSE, ponderou, contudo, que, boa ou má, a lei existe e deve ser observada, até que o Supremo Tribunal Federal venha eventualmente a considerá-la inconstitucional. Ele acrescentou que a vedação do anonimato teria o objetivo de dar ao ofendido a possibilidade de identificar o ofensor, para a apresentação de suas argumentações: "Essa judicialização não é ruim de todo porque alguém precisa dizer o que é certo e errado. Esses desafios todos também ocorrem com a pedofilia, por exemplo."

Talvez, mas não se trata aqui de direito criminal, e sim de direito de opinião. O presidente Lula, felizmente, vetou o trecho da Lei 12.034 que equiparava a web ao rádio e à TV, no que diz respeito a debates eleitorais, o que tornaria a lei ainda mais absurda. Rádio e TV são concessões públicas, e a postura do internauta, como se sabe, é completamente diferente da de ouvintes e telespectadores, que são passivos diante do conteúdo. O internauta, ao contrário, tem a iniciativa de buscar o site que deseja e interfere diretamente no conteúdo, com comentários, críticas e colaborações - além de poder se transformar ele próprio num veículo informativo, ao criar um blog ou site. São dois mundos distintos.

Apesar do veto parcial, permaneceram na lei as outras normas que tentam regular o debate político na rede. O diretor de Conteúdo do Grupo Estado, Ricardo Gandour, assinalou que os recorrentes excessos na tentativa de controle da informação infantilizam a sociedade: "A imprensa tem também a função de provocar certo desequilíbrio, e a sociedade deve ser livre para se informar. Não podemos confundir crescimento econômico, ascensão social, surgimento da classe C, com desenvolvimento. Temos que ter tensão e desequilíbrio para ter liberdade. Se você ergue muros e tenta controlar a circulação de informações você gera uma sociedade infantilizada."

A imprensa tem, de fato, o papel de refletir a agenda pública de discussões, com todas as suas contradições e diversidades, de forma crítica e independente, provocando desequilíbrio e incômodo. O ex-presidente Fernando Henrique - que foi muito atacado em sua gestão, apesar de alguns não se lembrarem - falou certa vez na "função irritante" da imprensa.

No final das contas, o debate revela um certo despreparo do Congresso, o seu distanciamento do mundo real e uma cultura política que ainda não se libertou totalmente da tentação autoritária, mesmo depois de 25 anos de redemocratização. Mas avançamos a cada eleição.
Fonte: A Gazeta

sexta-feira, 21 de maio de 2010

Sabores em risco

Não só animais estão ameaçados de extinção. No Brasil, há diversos alimentos perigando desaparecer - levando junto tradições culturais e memórias gastronômicas

Priscilla Santos

No caminho para casa, Carlo decidiu parar no restaurante de um velho amigo com o intuito de se recuperar de uma extenuante viagem com o afago de um prato de peperonata, ensopado italiano salpicado por um pimentão doce e carnudo da variedade "quadrado d’Asti". Para seu desalento, o que provou foi o empobrecimento do gosto daquela receita dos deuses, sendo que a qualidade do chef era inquestionável. Decepcionado, descobriu que aqueles pimentões perfumados e polpudos que povoavam sua memória gustativa quase não eram mais produzidos na região. No lugar deles, variedades insossas cultivadas em larga escala na Holanda haviam extorquido a originalidade da receita. "São mais baratos e ninguém compra os nossos", lhe explicou, mais tarde, um ex-produtor dos pimentões de Asti, que sorriu ao dizer que agora cultiva bulbos de tulipas e os envia à Holanda para florescer.

A concorrência dos alimentos produzidos em larga escala é apenas uma das causas que colocam cerca de 800 produtos em uma lista mundial de alimentos em risco de desaparecer. Isso mesmo: assim como animais, ingredientes também podem estar em processo de extinção, afinal, são frutos da natureza. O catálogo internacional chama-se Arca do Gosto, numa referência à metáfora bíblica da Arca de Noé. Foi elaborado e é atualizado constantemente por chefs de cozinha, agrônomos, cientistas da alimentação, jornalistas e antropólogos, que se voluntariam em um projeto da Fundação Slow Food pela Biodiversidade, presidida por Carlo Petrini, o Carlo, que não se conformou com o sumiço dos pimentões de Asti.

Para entrar na lista, um ingrediente ou alimento processado precisa não só estar em risco de sumir do mapa mas ter sabor especial, ser produzido em pequena escala de forma artesanal e estar ligado à memória e à identidade dos habitantes de certa região. "Para mim, como italiano, perder um queijo é como amputar uma igreja gótica ou um castelo medieval, pois gerações de pessoas trabalharam com esse alimento, é um patrimônio identitário, sem ele somos pobres", diz Petrini.

O mesmo vale para os ovos azuis e verdes das galinhas de Araucania, no Chile, o pão de centeio e aveia recheado com peixe ou carne de porco de Kuopio, na Finlândia, ou a marmelada de Santa Luzia, produzida em tachos de cobre, em pequenas quantidades, com marmelo português, na região de Luziânia, em Goiás. Esses doces, feitos por remanescentes quilombolas e embalados em caixas de madeira, enfrentam a concorrência de marmeladas de produção semi-industrial de qualidade duvidosa - e estão entre os 21 alimentos brasileiros na lista dos ameaçados de desaparecer. Nela, também constam frutas, castanhas, grãos e frutos do mar colocados em risco por motivos variados como a pesca predatória, o avanço de pastos, monoculturas e corte de madeira, que tomam o espaço de cultivo de saborosas variedades nacionais.

OSTRAS E CASTANHAS
Parece que as mulheres da comunidade de Mandira, no município paulista de Cananeia, são cozinheiras de mão cheia. Ao menos quando se trata do preparo de pão, torta ou farofa de ostra, que os turistas sortudos têm o prazer de experimentar. Diferentemente das ostras que mais se veem em restaurantes, nativas do Pacífico, essas são brasileirinhas e de mangue. Historicamente, a comunidade sempre usou o manguezal como fonte de alimento e renda, mas ele estava sendo destruído gradativamente. A solução foi criar uma reserva no local para protegê-lo. A comunidade também se organizou para formar a Cooperativa dos Produtores de Ostras de Cananeia (Cooperostra). O mesmo podia acontecer lá nos manguezais de Sergipe, onde vive um caranguejo de carne especialmente saborosa: o aratu, que está sendo afugentado, por exemplo, pela poluição do mangue, que recebe ração de criadouros de camarão da redondeza.

Já o pinhão da serra catarinense é petisco de primeira, quando assado na chapa do fogão a lenha, prato principal, quando acompanha um cozido de verduras e carnes chamado entrevero, e ainda merenda, quando recuperado o hábito indígena de embalá-lo com folha de araucária e assá-lo no fogo para depois ser descascado. É o pinhão sapecado, que os catadores do fruto levam para comer durante a jornada de trabalho. Não falta modo de preparo e de consumo do pinhão. Mas pode faltar ele mesmo. Tudo porque as araucárias nativas estão sendo substituídas pelo pinheiro-canadense, plantado para a exploração da madeira.

Nativa do cerrado, a castanha de baru tem sabor semelhante ao do amendoim e da castanha de caju. Pode protagonizar um pé-de-moleque bem original ou dar um gostinho diferente a um molho pesto. Mas também sofre com a exploração da madeira do baruzeiro e com o desmatamento do cerrado para expansão de pastos e monoculturas. Seu conterrâneo pequi conhece bem essa história. A frutinha, que dá sabor a arroz, feijão e frango cozido ou vira doce e licor, também está sofrendo com o mau hábito de "passar a corrente". Os moradores do cerrado contam que é comum as árvores serem derrubadas assim, com tratores puxando correntes e colocando tudo abaixo.

Para impedir que todos esses e outros tantos ingredientes sejam encontrados apenas em estampas de selos, existem diversos projetos para protegê-los. Da mesma forma que em Cananeia, os moradores das comunidades baianas que tiram grande parte de seu sustento do licuri (um coquinho apetitoso que pode ser degustado torrado, caramelizado ou em forma de paçoca) se organizaram em cooperativas. Ingredientes como o umbu (frutinha de sabor azedo que dá no Nordeste) e o palmito juçara (tradicionalmente consumido pelos índios guaranis, no Sudeste) estão em projetos de conservação do Slow Food, as chamadas Fortalezas.

Em parceria com as comunidades locais, trabalha-se para que certos ingredientes não deixem de ser produzidos, incentivando a variedade de receitas, facilitando o contato do produtor com o mercado e divulgando os produtos para que sejam mais consumidos. Afinal, pode parecer contraditório, mas alguns alimentos correm risco de extinção não porque foram explorados demais, mas sim de menos. É o caso até do arroz e do feijão. Não aquele de todo dia, mas variedades que você precisa conhecer.

ARROZ E FEIJÃO
O arroz vermelho chegou ao Brasil no século 16. Os próprios portugueses que o trouxeram boicotaram sua produção mais tarde, pois a coroa só queria o arroz branco para enviar à metrópole. O grão avermelhado, com toque de castanha e amêndoas, encontrou refúgio no semiárido nordestino, especialmente na Paraíba, onde se tornou prato típico do sertanejo. Porém, muitas vezes o homem rural não consegue fazer dessa iguaria culinária seu ganha-pão. "Muitos agricultores produzem o arroz branco, que é mais comercial, e o vendem para comprar o vermelho, pois é muito importante tê-lo nas festas e na mesa", diz Roberta Sá, presidente da comissão brasileira da Arca do Gosto. A história se repete com o feijão-canapu, uma variedade de feijão-de-corda comum no Piauí, onde dá sabor a receitas regionais como o mungunzá, prato que também leva milho e carne de porco e é servido em dias de festa. São dois casos em que o que falta é mais gente conhecer o ingrediente.

É por isso que muitos chefs de cozinha passaram a adotar essas iguarias em suas receitas. Anayde Lima, proprietária do restaurante Júlia, em São Paulo, já fez até festival com ingredientes que perigam ir para as cucuias. Um prato que fez muita gente lamber os dedos foi o arroz vermelho com feijão-canapu e pinhão, triplamente salvador de gostosuras. Anayde costuma usar ingredientes em risco de extinção também no "prato do dia" e coloca a historinha do alimento no menu. Quem experimenta se surpreende. "A diferença desses produtos é que eles têm personalidade, um sabor presente. Em geral, o que dá gosto à comida é o tempero. Mas já servi arroz vermelho cozinhado só com água e sal, e o sabor é intenso", diz.

Ela lembra que também foi de comer de joelhos o doce de corte de umbu (ameaçado!) com queijo de cabra, no lugar do tradicional Romeu e Julieta, calda de cambuci (ameaçado!) com cheesecake e sorvetes artesanais de mangaba e cagaita (ameaçadas!), mas sem leite, para acentuar o sabor dessas frutas azedinhas. A ideia é que, pouco a pouco, as pessoas aprendam a apreciar esses ingredientes. Quem sabe assim não conseguimos salvá-los da extinção e ainda torná-los deliciosos ícones de nossas mesas e memórias? Ficaríamos tão contentes como os italianos de Asti, que agora podem sorrir ao informar que os suculentos pimentões quadrados voltaram a ser produzidos.
Fonte: Revista Vida Simples

Perda de biodiversidade já ameaça economia, diz ONU

A destruição de ecossistemas da Terra deve começar a afetar economias de vários países nos próximos anos, de acordo com um relatório da Organização das Nações Unidas (ONU), divulgado nesta segunda-feira.

O Terceiro Panorama Global de Biodiversidade (Global Biodiversity Outlook ou GBO-3, na sigla em inglês) afirma que vários ecossistemas podem estar próximos de sofrer mudanças irreversíveis, tornando-se cada vez menos úteis à humanidade.

Entre estas mudanças, segundo o relatório da ONU estariam o desaparecimento rápido de florestas, a proliferação de algas em rios e a morte generalizada de corais.

Até o momento, a ONU calculou que a perda anual de florestas custa entre US$ 2 trilhões e US$ 5 trilhões, um número muito maior que os prejuízos causados pela recente crise econômica mundial.

O cálculo foi feito com base nos valores estipulados em um projeto chamado Economia dos Ecossistemas e da Biodiversidade (EEB) para serviços prestados pela natureza, como a purificação da água e do ar, a proteção de regiões litorâneas de tempestades e a manutenção da natureza para o ecoturismo.

"Muitas economias continuam cegas ao enorme valor da diversidade de animais, plantas e outras formas de vida e ao seu papel no funcionamento de ecossistemas saudáveis", disse o diretor-executivo do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma), Achim Steiner.

"A humanidade criou a ilusão de que, de alguma forma, é possível se virar sem biodiversidade, ou de que isso é periférico no mundo contemporâneo", disse ele.

"Na verdade, precisamos dela mais do que nunca em um planeta com seis bilhões de pessoas indo a nove bilhões em 2050."

Segundo a ONU, quanto maior for a degradação dos ecossistemas, maior será o risco de que elas percam grande parte de sua utilidade prática para o homem.

Exemplo brasileiro

A Amazônia é citada como um dos ecossistemas ameaçados de atingir o chamado "ponto sem volta", mesmo com a recente diminuição nas taxas de desmatamento e com o plano de redução do desmatamento, que prevê a redução de 80% até 2020 em relação à média registrada entre 96 e 2005.

O relatório da ONU cita um estudo coordenado pelo Banco Mundial que afirma que se a Amazônia perder 20% de sua cobertura original, em 2025, certas partes da floresta entrariam em um ciclo de desaparecimento agravado por problemas como mudanças climáticas, queimadas e incêndios.

O relatório ressalta que o plano brasileiro deixaria o desmatamento acumulado muito próximo de 20% da cobertura original.

No entanto, o Brasil também é citado como exemplo no que diz respeito à criação de áreas de proteção ambiental.

"Alguns poucos países tiveram uma contribuição desproporcional para a expansão da rede global de áreas protegidas (que, segundo o relatório cresceu 57%): dos 700 mil quilômetros quadrados transformados em áreas de proteção desde 2003, quase três quartos ficam no Brasil, em grande parte, resultado do Programa de Áreas Protegidas da Amazônia (Arpa)."

Na Convenção sobre Diversidade Biológica (CBD, na sigla em inglês), no mês passado, cientistas afirmaram que os governos nacionais não conseguiriam respeitar as suas metas de redução da perda de biodiversidade até 2010.

"Não são boas notícias", disse o secretário-executivo da CBD, Ahmed Djoglaf.

"Continuamos a perder biodiversidade em um ritmo nunca visto antes na História. As taxas de extinção podem estar até mil vezes acima da taxa histórica."

Metas fracassadas

A ONU diz ainda que a variedade de vertebrados no planeta - uma categoria que abrange mamíferos, répteis, pássaros, anfíbios e peixes - caiu cerca de um terço entre 1970 e 2006.

A meta de redução de perda de biodiversidade foi acertada durante uma reunião em Johanesburgo, na África do Sul, em 2002. No entanto, já se sabia que seria difícil mantê-la.

A surpresa do relatório GBO-3 é que outras 21 metas subsidiárias tampouco serão cumpridas globalmente.

Entre elas, estão a redução da perda e degradação de habitats, a proteção de pelo menos 10% das regiões ecológicas do planeta, controle da disseminação de espécies invasivas e a prevenção de extinção de espécies devido ao comércio internacional.

Uma sinal claro do fracasso registrado no relatório é que nenhum dos países envolvidos conseguirá atingir todas as metas até o fim do ano.
Fonte: Instituto Ecoclima | O Estadão

quarta-feira, 19 de maio de 2010

A força das mulheres


A questão ambiental

A questão ambiental deverá ganhar corpo e consistência nos debates que antecederão a eleição de outubro para a presidência do país. E a principal razão para isso está na candidatura à presidência da senadora Marina Silva, que coloca o tema meio ambiente como foco central da sua plataforma de campanha. Fato importante, especialmente num período da história da humanidade no qual estão sendo observados fenômenos mais intensos que tendem a comprometer a capacidade do planeta terra suportar as crescentes agressões operadas pelos seus habitantes. O aquecimento global e o aumento da frequência de desastres naturais são parte desse processo, do qual o nosso Brasil tem grande responsabilidade e dele também não escapa.

O lado bom dessa novidade está no fato de podermos contar agora com a politização - no bom sentido, é preciso que se diga - de um tema que se torna cada vez mais importante na construção do futuro do país e da humanidade. O que se espera é que essa boa nova passe a contaminar também as demais plataformas de campanha ao cargo máximo do país. Teremos assim um espaço aberto para discussões, mas, sobretudo, para a construção de condições que garantam um crescimento econômico com sustentabilidade, de tal forma a não comprometer a sobrevivência de gerações futuras.

Diferentemente do que aconteceu no passado na história da humanidade, nos casos de verdadeiros colapsos de sociedades específicas - e estamos nos referindo tanto a um passado longínquo como também ao mais próximo -, hoje, temos conhecimento e noções claras das consequências dos nossos atos e práticas em relação ao meio físico em que vivemos. Se desmatamos, degradamos o solo e produzimos gases que contribuem para o aquecimento global, sabemos quais são os resultados em termos de impactos negativos. Não seria o caso, por exemplo, da sociedade dos Maias na América Central, que sucumbiram mais pela forma predatória como construíram o seu império do que pela brutalidade da invasão dos espanhóis; como também a sociedade avançada dos anasazi no sudoeste dos Estados Unidos - Chaco Canyon -, por volta de 1.300, que devastou suas florestas e produziu desertos. Ambos os casos tão bem demonstrados pelo cientista Jared Diamond em seu livro Colapso (Editora Record, 2009). Já o caso mais atual é o do Haiti.

O que a história nos ensina é que a maioria dos "colapsos" de sociedades teve como causa fundamental problemas relativos à questão ambiental, principalmente aqueles relacionados ao esgotamento das condições de oferta de alimentos e de energia. Em contrapartida, os casos de sucesso, que infelizmente são encontrados em menor número, são explicados exatamente pelo cuidado no trato com a natureza, em especial com as florestas e com a água. O caso do Japão talvez seja o mais emblemático, pela dimensão territorial e densidade populacional, mas principalmente pela presteza em antecipar-se aos problemas. Depois de passar por um processo rápido de devastação de suas florestas até meados de 1.700, os japoneses começaram a planejar a ocupação de seu território, concentrando sua população nas regiões planas e destinando praticamente 80% do território como área de preservação, em grande parte através de florestas plantadas.

Nessa questão, o que se espera é que o Brasil siga as trajetórias de sucesso. Mas, para isso precisa, sobretudo, decisão política.

Orlando Caliman
Fonte: A Gazeta

quinta-feira, 13 de maio de 2010

O que celebrar no dia do combate ao racismo?


Igualdade e diferença
Daury Cesar Fabriz

Considera-se racismo toda hostilidade que se impinge contra um determinado grupo de pessoas em razão dos seus aspectos étnicos. Por intermédio de práticas racistas busca-se reduzir o Outro em sua dignidade. O menosprezo levar a segregação e a eliminação simbólica. È forma de dominação, onde a desclassificação do Outro é utilizado como fundamento para impedir que pessoas etnicamente diferentes possam se emancipar e ocupar importantes espaços nas estruturas de poder. A residência com o Outro se torna degradante quando essa redução torna-se algo natural. Assim, constitui uma prática que não pode ser tolerada numa sociedade que se pretende civilizada.

Raça é um conceito atrelado aos discursos produzidos no plano sócio-econômico; portanto construído pelo grupo dominante visando justificar exclusões. O processo de naturalização da desvalorização do outro se concretiza a partir dos métodos da violência simbólica, na produção negativa de alteridades.


Para a antropologia somente existe uma raça que abriga todos os seres humanos. Para o Direito todos são iguais, devendo ser respeitadas todas as diferenças. Vale ressaltar que ninguém nasce racista. Aprendemos o preconceito racial com os nossos pais, os grupos sociais etc.


A construção do estigmatizável passa pela reprodução e internalização do discurso dominante. Estamos acostumados a dizer que nós brasileiros somos um povo multicultural e nos vangloriamos da tolerância com o Outro, etnicamente diferente. Esse discurso é uma maneira sutil de discriminação. A postura com o Outro não deve ser de simples tolerância, mas de pleno respeito.


A Constituição Brasileira de 88 avançou nesse campo, estabelecendo no artigo 5º, Inciso XLII que a prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão. Desse dispositivo constitucional originaram-se as Leis 7.716/89, 9.459/97 e 8.081/90; além do Decreto nº 4.886/03 que instituiu a Política Nacional de Promoção da Igualdade Racial. São boas leis que reprimem qualquer forma de discriminação racial, com previsão de penas para aqueles que praticam essas condutas criminosas. Mas não bastam as leis. É preciso mais.


A igualdade não se contrapõe às diferenças, mas sim, às desigualdades. Desigualdades sociais, econômicas e culturais que impedem a emancipação dos estigmatizáveis. Aos grupos etnicamente domináveis é preciso conceder canais de acesso às várias formas de discurso público disponíveis, quais sejam: esfera política, comunicação de massa, educação, pesquisa etc. Além disso, faz-se necessário a geração de condições materiais para que os direitos possam ser exercitados de forma igual. Igualdade no plano da cidadania e do consumo. O repúdio ao preconceito racial dever vir acompanhado do repúdio às desigualdades econômicas e sociais. A superação dessas desigualdades encontra-se na plena realização dos direitos humanos.


Daury Cesar Fabriz
é Mestre e Doutor em Direito Constitucional e coordenador do Mestrado em Direito da FDV.

A sociedade que queremos

Gustavo Henrique Araújo Forde

Nunca temas como diversidade étnico-racial, multiculturalismo, inclusão e racismo foram tão presentes nos debates acadêmicos, sociais e políticos. Todavia, em alguns setores há tendência em "celebrar a diferença, sem fazer diferença". Celebra-se o outro, desde que permaneça no lugar que lhe é designado: um lugar estático e exótico. Nesta tendência, é defendido um modelo de sociedade multicultural e pluriétnica, desde que não exista qualquer necessidade de redistribuição de poder e de patrimônio material e imaterial. É neste cenário que propomos refletir este dia 13 de maio, data transformada em Dia Nacional de Denúncia contra o Racismo, em 1978, pelo Movimento Negro Unificado, contestando, assim, a oficialidade da Abolição da Escravatura.


No Brasil, não há uma política de apartheid, entretanto, há um imenso abismo social entre brancos e não-brancos, como demonstram as pesquisas científicas que tratam das desigualdades raciais no Brasil. É notório, também, que de 1888 até 2010 muitas mudanças ocorreram. Da luta pela liberdade no século XIX, passamos pela denúncia ao mito da democracia racial no século XX e chegamos ao século XXI com a responsabilidade de promover a igualdade racial entre todos os brasileiros.


Urge, desta forma, a demanda por um programa de ações afirmativas na sociedade brasileira. Este debate culminou durante a realização da II Conferência Mundial Contra o Racismo, Xenofobia e Intolerância, realizada em 2001, em Durban - África do Sul, da qual o Brasil foi signatário. As ações afirmativas tratam de políticas públicas nas esferas jurídicas, administrativas e acadêmicas; que apontam para a mudança de postura da União, Estados e Municípios, de simplesmente proibir a discriminação, para adotar posturas efetivas em favor daqueles discriminados e excluídos socialmente, visando a superação das desigualdades entre brancos e não-brancos.


São várias as dificuldades na efetividade da promoção da igualdade racial, dentre elas, a resistência de alguns segmentos da sociedade. Como ocorreu no período abolicionista, a posição destes segmentos indica uma resistência às possibilidades reais de alterar, mesmo que minimamente, o "status quo social" e, assim, reflete uma preocupação dos herdeiros beneficiários da herança escravocrata brasileira. Concluindo sem finalizar o debate, destaco a assertiva da professora Petronilha Beatriz Gonçalves e Silva: "para reeducar as relações étnico-raciais no Brasil é necessário fazer emergir as dores e medos que têm sido gerados. É preciso entender que o sucesso de uns tem o preço da marginalização e da desigualdade impostas a outros. E então decidir que sociedade queremos construir daqui para frente". Neste 13 de maio, refletir o modelo de sociedade que queremos viver trata de boa tarefa à sociedade brasileira. O convite está feito!


Gustavo Henrique Araújo Forde
é mestre em Educação pela Ufes, coordenador do Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros do Ifes (Neab-Ifes) e militante do movimento negro no Espírito Santo.
Fonte: A Gazeta

quarta-feira, 12 de maio de 2010

Reviravolta política já provoca resistência de boa parte dos eleitores a Paulo Hartung

Renata Oliveira
Foto: Ricardo Medeiros

Para o mercado político, a queda no peso da influência do governador Paulo Hartung na escolha de seu sucessor na eleição deste ano pode ser medida nas ruas Estado afora. Alguns políticos têm sentido uma forte resistência do eleitorado ao nome do governador depois da reviravolta política, do último dia 28 de abril, que descartou Ricardo Ferraço (PMDB) da candidatura ao governo e colocou no seu lugar Renato Casagrande (PSB).


Embora o governo negue, a mudança foi costurada em Brasília como parte do acordo com o PSB que resultou no recuo da candidatura do deputado federal Ciro Gomes (PSB-CE) à presidência da República. O governador Paulo Hartung, porém, afinou o discurso com Ricardo e Casagrande para que a decisão fosse passada aos meios políticos e à população como uma manobra local.


A expressão sofrida de Ricardo Ferraço e a declaração de que fora “consumido pelo fogo amigo” transformaram o governador no algoz de seu vice e a imagem chegou ao eleitorado, sobretudo àquele propenso a votar no peemedebista.


O ônus pela dissolução do bloco que apoiava Ricardo Ferraço foi parar na conta de Hartung e, em principio, a ideia geral era de que a insatisfação havia se instalado na classe política, sobretudo entre membros do bloco aliado de Ricardo Ferraço. Mas nas ruas o sentimento parece ter tomado conta do eleitorado, que vem demonstrando grande resistência ao governador e externando a indignação com a manobra.


O que gerou a indignação do eleitor, assim como da classe política, foi a forma como a mudança se processou. O anúncio aconteceu em uma semana em que vários partidos estavam declarando apoio à candidatura do vice e Ricardo aparecia na frente na corrida eleitoral. Sem grandes explicações, o governador apareceu em uma entrevista coletiva dizendo que o cabeça da chapa havia sido trocado.


Diante do desgaste causado pelo episódio, os partidos tendem a orientar seus candidatos a manterem a independência da imagem de Hartung, até que a situação se amenize. Mas, se o governador não trabalhar a recuperação de sua imagem, nitidamente arranhada depois da manobra, pode acabar não tendo o mesmo destaque de antes no palanque de seus aliados.


Tanto Renato Casagrande (PSB) quanto Luiz Paulo Vellozo Lucas (PSDB) são da base aliada do governador Paulo Hartung, mas, se a queda no poder de influência do governador atingir sua popularidade, os candidatos podem ter dificuldade em caminhar com o governador, independentemente de quem ele vier a apoiar.


Uma pesquisa publicada nessa terça-feira (11) mostrou que, apesar dos 49% de influência do governador na escolha do sucessor, o peso de sua indicação caiu cerca de 20% em relação à pesquisa anterior, que era de 69%. O índice não significa queda na popularidade do governador, mas, se o desgaste perdurar, a aprovação de Hartung pode ficar prejudicada na visão do eleitor.

Fonte: Século Diário