quinta-feira, 13 de maio de 2010

O que celebrar no dia do combate ao racismo?


Igualdade e diferença
Daury Cesar Fabriz

Considera-se racismo toda hostilidade que se impinge contra um determinado grupo de pessoas em razão dos seus aspectos étnicos. Por intermédio de práticas racistas busca-se reduzir o Outro em sua dignidade. O menosprezo levar a segregação e a eliminação simbólica. È forma de dominação, onde a desclassificação do Outro é utilizado como fundamento para impedir que pessoas etnicamente diferentes possam se emancipar e ocupar importantes espaços nas estruturas de poder. A residência com o Outro se torna degradante quando essa redução torna-se algo natural. Assim, constitui uma prática que não pode ser tolerada numa sociedade que se pretende civilizada.

Raça é um conceito atrelado aos discursos produzidos no plano sócio-econômico; portanto construído pelo grupo dominante visando justificar exclusões. O processo de naturalização da desvalorização do outro se concretiza a partir dos métodos da violência simbólica, na produção negativa de alteridades.


Para a antropologia somente existe uma raça que abriga todos os seres humanos. Para o Direito todos são iguais, devendo ser respeitadas todas as diferenças. Vale ressaltar que ninguém nasce racista. Aprendemos o preconceito racial com os nossos pais, os grupos sociais etc.


A construção do estigmatizável passa pela reprodução e internalização do discurso dominante. Estamos acostumados a dizer que nós brasileiros somos um povo multicultural e nos vangloriamos da tolerância com o Outro, etnicamente diferente. Esse discurso é uma maneira sutil de discriminação. A postura com o Outro não deve ser de simples tolerância, mas de pleno respeito.


A Constituição Brasileira de 88 avançou nesse campo, estabelecendo no artigo 5º, Inciso XLII que a prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão. Desse dispositivo constitucional originaram-se as Leis 7.716/89, 9.459/97 e 8.081/90; além do Decreto nº 4.886/03 que instituiu a Política Nacional de Promoção da Igualdade Racial. São boas leis que reprimem qualquer forma de discriminação racial, com previsão de penas para aqueles que praticam essas condutas criminosas. Mas não bastam as leis. É preciso mais.


A igualdade não se contrapõe às diferenças, mas sim, às desigualdades. Desigualdades sociais, econômicas e culturais que impedem a emancipação dos estigmatizáveis. Aos grupos etnicamente domináveis é preciso conceder canais de acesso às várias formas de discurso público disponíveis, quais sejam: esfera política, comunicação de massa, educação, pesquisa etc. Além disso, faz-se necessário a geração de condições materiais para que os direitos possam ser exercitados de forma igual. Igualdade no plano da cidadania e do consumo. O repúdio ao preconceito racial dever vir acompanhado do repúdio às desigualdades econômicas e sociais. A superação dessas desigualdades encontra-se na plena realização dos direitos humanos.


Daury Cesar Fabriz
é Mestre e Doutor em Direito Constitucional e coordenador do Mestrado em Direito da FDV.

A sociedade que queremos

Gustavo Henrique Araújo Forde

Nunca temas como diversidade étnico-racial, multiculturalismo, inclusão e racismo foram tão presentes nos debates acadêmicos, sociais e políticos. Todavia, em alguns setores há tendência em "celebrar a diferença, sem fazer diferença". Celebra-se o outro, desde que permaneça no lugar que lhe é designado: um lugar estático e exótico. Nesta tendência, é defendido um modelo de sociedade multicultural e pluriétnica, desde que não exista qualquer necessidade de redistribuição de poder e de patrimônio material e imaterial. É neste cenário que propomos refletir este dia 13 de maio, data transformada em Dia Nacional de Denúncia contra o Racismo, em 1978, pelo Movimento Negro Unificado, contestando, assim, a oficialidade da Abolição da Escravatura.


No Brasil, não há uma política de apartheid, entretanto, há um imenso abismo social entre brancos e não-brancos, como demonstram as pesquisas científicas que tratam das desigualdades raciais no Brasil. É notório, também, que de 1888 até 2010 muitas mudanças ocorreram. Da luta pela liberdade no século XIX, passamos pela denúncia ao mito da democracia racial no século XX e chegamos ao século XXI com a responsabilidade de promover a igualdade racial entre todos os brasileiros.


Urge, desta forma, a demanda por um programa de ações afirmativas na sociedade brasileira. Este debate culminou durante a realização da II Conferência Mundial Contra o Racismo, Xenofobia e Intolerância, realizada em 2001, em Durban - África do Sul, da qual o Brasil foi signatário. As ações afirmativas tratam de políticas públicas nas esferas jurídicas, administrativas e acadêmicas; que apontam para a mudança de postura da União, Estados e Municípios, de simplesmente proibir a discriminação, para adotar posturas efetivas em favor daqueles discriminados e excluídos socialmente, visando a superação das desigualdades entre brancos e não-brancos.


São várias as dificuldades na efetividade da promoção da igualdade racial, dentre elas, a resistência de alguns segmentos da sociedade. Como ocorreu no período abolicionista, a posição destes segmentos indica uma resistência às possibilidades reais de alterar, mesmo que minimamente, o "status quo social" e, assim, reflete uma preocupação dos herdeiros beneficiários da herança escravocrata brasileira. Concluindo sem finalizar o debate, destaco a assertiva da professora Petronilha Beatriz Gonçalves e Silva: "para reeducar as relações étnico-raciais no Brasil é necessário fazer emergir as dores e medos que têm sido gerados. É preciso entender que o sucesso de uns tem o preço da marginalização e da desigualdade impostas a outros. E então decidir que sociedade queremos construir daqui para frente". Neste 13 de maio, refletir o modelo de sociedade que queremos viver trata de boa tarefa à sociedade brasileira. O convite está feito!


Gustavo Henrique Araújo Forde
é mestre em Educação pela Ufes, coordenador do Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros do Ifes (Neab-Ifes) e militante do movimento negro no Espírito Santo.
Fonte: A Gazeta

Nenhum comentário:

Postar um comentário