quinta-feira, 22 de abril de 2010

Tancredo há 25 anos, como se fosse hoje

Há um quarto de século, morreu Tancredo Neves. Na noite de 14 de março de 1985, os brasileiros foram dormir esperando assistir as cenas de sua posse na manhã seguinte e acordaram com o último dos generais deixando o palácio pela porta dos fundos, enquanto José Sarney vestia a faixa presidencial. Na noite de 21 de abril, Tancredo chegou a Brasília, morto.

Ele foi uma resultante. Somava marqueses da ditadura, cardeais da moderação democrata-cristã, comissários de uma esquerda mais ou menos convicta. Morto Tancredo, a coligação perdeu o nexo e, aos poucos, deslizou para o colapso financeiro da hiperinflação e o desastre político do collorato.

Passados 25 anos, persiste o mito de que Tancredo Neves era um conservador. Com aquele jeito, falando baixo, sempre de terno, só podia ser. Além disso, seu conservadorismo seria um bálsamo capaz de aliviar o passado de Sarney e o futuro de Fernando Henrique Cardoso. Um mito conveniente.

Felizmente, o jornalista Mauro Santayana organizou o livro “Tancredo: o verbo republicano”, com os textos dos últimos discursos e entrevistas de Tancredo Neves. Santayana assessorou-o por quase vinte anos. Na tarde de 14 de março de 1985, passou cerca de duas horas com ele, revendo o discurso que faria na manhã seguinte, ao tomar posse. Semanas depois, quando se sabia que Tancredo não sairia vivo do hospital, Santayana entregou os originais a Risoleta Neves, mulher do presidente eleito.

A primeira metade do discurso de Tancredo contém uma das mais belas páginas da oratória política nacional. Elegante no estilo, profético no conteúdo. Em alguns momentos impressiona pela atualidade, mas se isso indica a clarividência de Tancredo, ilustra também a mediocridade do debate nos 25 anos que se seguiram.

Alguns trechos:

Temos construído esta Nação com êxitos e dificuldades, mas não há dúvida, para quem saiba examinar a História com isenção, de que o nosso progresso político deveu-se mais à força reivindicadora dos homens do povo do que à consciência das elites. (...) A pátria dos pobres está sempre no futuro e, por isso, em seu instinto, eles se colocam à frente da História.

A legislação sindical brasileira se encontra envelhecida. (...) A unidade sindical não pode ser estabelecida por lei, mas surgir naturalmente da vontade dos filiados. (...)

Os sindicatos não podem submeter-se à tutela do governo nem subordinar-se aos interesses dos partidos políticos.

Já vivemos, nas grandes cidades brasileiras, permanente guerra civil (...). É natural que todos reclamem mais segurança nas ruas, e é dever do Estado garantir a vida e os bens dos cidadãos. Essa garantia, sabemos todos, não será oferecida com o aumento do número de policiais, ou com a multiplicação dos presídios. É muito mais fácil entregar ferramentas aos homens do que armá-los, e muito mais proveitoso para a sociedade dar pão e escola às crianças abandonadas, do que, mais tarde, segregar adultos criminosos. A história nos tem mostrado que, invariavelmente, o exacerbado egoísmo das classes dirigentes as tem conduzido ao suicídio total.

Temos de ampliar o mercado interno, o único com que podem contar permanentemente os empresários brasileiros. Não se amplia o mercado interno sem que haja mais empregos e mais justa distribuição da renda nacional
Elio Gaspari A Gazeta

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