quarta-feira, 22 de setembro de 2010

A dança da diferença

Por Vera Ligia Rangel
Há 18 anos, a bailarina Dora Andrade criou um projeto de dança que revolucionou a vida de menores em condições desfavoráveis no Nordeste. O trabalho começou na comunidade do Morro de Santa Terezinha, no bairro Mucuripe, em Fortaleza, no Ceará. A escolha da região foi feita em função de um problema social que ganhava contornos maiores e mais assustadores a cada dia. “A cidade era recordista mundial em prostituição infantil e no morro foi detectada uma migração das crianças para a praia, um espaço de risco pessoal para elas nesse contexto”, diz a bailarina. “A dança ajudou as crianças a recuperarem a autoestima e terem outra perspectiva de vida”, diz.

Nos primeiros quatro anos de existência, a Edisca foi apoiada pelo Governo do Estado do Ceará. Depois disso, estabeleceu-se uma parceria importante com o Instituto Ayrton Senna, que possibilitou a ampliação da área pedagógica, artística e de gestão, e aumentou a rede de relacionamentos locais, nacionais e até internacionais da escola.

Em 1997, as lições de amor e de arte ensinadas na Edisca chamaram a atenção da equipe de Marie Claire. A revista publicou, então, uma matéria intitulada A Dança das Severinas, na edição 81, na qual foram relatadas histórias emocionantes das personagens que subiam aos palcos e davam vida e movimento a todo o aprendizado cotidiano. Pela matéria e pelas fotos, Marie Claire recebeu o Prêmio Ayrton Senna de Jornalismo, um dos mais conceituados da área.

De lá para cá, a Edisca evoluiu muito e tornou-se um ponto de referênciano universo da educação. Além de aulas de balé clássico e da formação de um corpo de baile, a escola ofereceaos alunos curso de teatro, reforçoescolar, informações complementares àquelas oferecidas na escola, almoço, vale-transporte, figurino para as aulas e apresentações, e atendimento nas mais diversas especialidades médicas. Nesse ambiente acolhedor, as crianças ficam distantes dos focos de marginalidade durante o horário em que não estão na escola, podem ter uma profissão ou um hobby, viajar para outros países para apresentar suas coreografias, integrar-se totalmente à sociedade. “Amissão da Edisca não é formar bailarinos, mas principalmente oferecer uma educação de qualidade para crianças pobres”, diz Dora. “Queremos tornar os cidadãos sensíveis, criativos e éticos, por meio de uma pedagogia transformadora e centralizada na arte.”

A seleção é feita com crianças entre 8 e 12 anos, que permanecem em média cinco anos no local. Os menores, hoje, vêm ainda do Morro do Mucuripe e adjacências e de outras favelas de Fortaleza, como o Conjunto Palmeiras, Grande Bom Jardim e Morro do Dendê. Uma das exigências para participar da Edisca é estar matriculadona escola formal. Após a inscrição, o candidato passa por uma avaliação de coordenação motora, flexibilidade, concentração e lateralidade. A segunda etapa é denominada Colônia deFérias e nela as 150 crianças pré-selecionadastêm contato com a linguagem de teatro, dança e artes plásticas, e são avaliadas em seus aspectos pessoais,sociais, cognitivos e produtivos.

Atualmente, a Edisca tem capacidade para atender 400 crianças e adolescentes, além das 50 mães envolvidas no projetoVida Feminina, que visa ao fortalecimento do núcleo familiar e oferece oficinas profissionalizantes e alfabetização para adultos. O espaço físico cresceu muito e a escola hoje conta com duas salas de dança de 100m² cada; um ateliê de artes plásticas de 100 m²; um teatro para 250 pessoas, uma biblioteca com computadores e um acervo de 5 mil livros; quatro salas para oficinas de estudo; um refeitório; duas salas para cursos profissionalizantes e de capacitação; uma área de saúde com recepção e duas salas de atendimento; uma área de psicologia; salas de administração e casinha de bonecas. A escola funciona em dois turnos, manhã e tarde, paraatender aos alunos no horário complementar à escola.

Na opinião de Dora, os resultados sociais de todasessas oportunidades e estrutura já são evidentes na prática. “Eu tive a honra de conviver com grandes sábias,que tomaram para si o controle do seu destino, acreditaram ser possível entrar em uma faculdade pública, educar melhor seus filhos, agir de forma responsável e social com toda a sua rede de relações e fazer valer sua voz de cidadã”, diz.

A estudante de educação física e professora de dança da Edisca Tatiane de Jesus Gama, 27 anos, é um bomexemplo dessa trajetória. “Aos 8 anos eu tinha o grande sonho de ser bailarina, mas minha família não tinha condições de pagar uma escola de balé clássico pra mim. Na Edisca encontrei o caminho da auto confiança, aprendi a expressar meus sentimentos e a olhar o mundo com esperança e sem medo”, diz. A bailarina e estudante Jamila de Oliveira Lopes, 18 anos, é outra ex-aluna que teve a chance de sonhar com um futuro melhor. “Atravésda arte eu ganhei valores emocionais e fiquei mais forte. E isso eu carrego sempre comigo”, diz Jamila.

Para a realização e continuidade desse projeto artístico e educativo, a Edisca conta com doações de pessoas físicas ou jurídicas. Mais informações no site: www.edisca.com.br ou pelos telefones (85) 3278-1515 (85) 3278-1515 e (85) 3401-0000 (85) 3401-0000 .
Fonte: Revista Marie Claire

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